Artigo Publicado no site Nova Criminologia


PSICOLOGIA COMUNITÁRIA E POLÍTICAS PÚBLICAS: FUNDAMENTOS TEÓRICOS, METODOLÓGICOS E POSSÍVEIS ÁREAS DE ATUAÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO

Fabrícia Vieira dos Reis*


RESUMO

Essa pesquisa aborda o tema da Psicologia comunitária e as políticas públicas em seus fundamentos teóricos e metodológicos, mostrando possíveis áreas de atuação no mercado de trabalho. Como exemplo de atuação do psicólogo foi contextualizado a existência do Núcleo de Prevenção à Criminalidade – NPC, onde foi citado o PrEsp – Programa de Reintegração do Egresso do Sistema Prisional/Penal, que trabalha com os Egressos que retornam do sistema prisional, além de abordar também outras formas de inserção do psicólogo na área comunitária e de políticas públicas.

Palavras – chave: Psicologia comunitária. Políticas públicas. Psicologia. Egresso.

ABSTRACT

This research addresses the issue of Community psychology and public policy in its theoretical and methodological approaches, showing possible areas of activity in the labor market. As an example of the psychologist's performance was contextualized the existence of the Prevention of Crime - NPC, where he was quoted the Prespa - Program for Reintegration of former convicts / Criminal working with the Alumni returning from prison, and approaches also other forms of integration of the psychologist in the community and public policy.

Keywords: Community psychology. Policies. Psychology. Egress.


* Aluna do10ª período do curso de Psicologia / 2010 da Universidade Vale do Rio Doce. Estagiária de psicologia do TJMG e do Núcleo de Prevenção à Criminalidade – NPC em Governador Valadares.





INTRODUÇÃO

Esse trabalho aborda conceitos básicos da psicologia comunitária e das políticas públicas, onde se pode perceber que fazer psicologia comunitária é estudar as condições internas e externas ao homem que o impedem de ser sujeito e as condições que o fazem sujeitos numa comunidade ao mesmo tempo em que, no ato de compreender, trabalhar como esse homem a partir dessas condições, na construção de sua personalidade, de sua individualidade crítica, da consciência de si – identidade – e de uma nova realidade social.

O grupo profissional chega à definição clara de seu objetivo que seria o de proporcionar o crescimento da consciência dessa população através da participação dos indivíduos em grupos, que os levariam a superar o individualismo e a se unirem em atividades que visassem mudar o seu cotidiano.

Nessa pesquisa foi utilizado inicialmente o conceito sobre os fundamentos teóricos da psicologia comunitária, onde mostra o levantamento das necessidades e carências vividas pelo grupo-cliente, sobretudo no que se refere às condições de saúde, educação e saneamento básico.

Após aparece o conceito de políticas públicas de acordo com um dos autores citados, onde mostra que a mesma tem uma vasta opção de trabalho por proporcionar a possibilidade de executar um trabalho multidisciplinar.

Em seguida é apresentado o PrESp - Programa de Reintegração do Egresso do Sistema Prisional/Penal, que aborda a temática do usuário do programa sendo um componente de fundamental importância para a reintegração social do sujeito que retorna do sistema prisional e precisa ser inserido na sociedade de forma digna e com qualificação profissional para que não retorne à prisão.

Na parte final do trabalho foi abordado como o profissional da psicologia, assim como, toda a equipe multidisciplinar pode atuar na psicologia comunitária e nos programas de políticas públicas que permitem a inserção desses profissionais para a realização do trabalho subjetivo e efetivo com cada membro da sociedade. Trabalhando assim não apenas o sujeito como individuo, mas atuando em todo o seu contexto familiar e social para que seu meio se torne propício as suas necessidades diárias como cidadão.


Psicologia Social Comunitária

Desde meados da década de 60, no Brasil, a utilização de teorias e métodos da psicologia em trabalhos feitos em comunidades de baixa renda, visa deselitizar a profissão, e buscam a melhoria das condições de vida da população trabalhadora, além de constituir o espaço teórico e prático do que passamos a denominar a “psicologia comunitária”, ou “psicologia na comunidade” (Freitas, 1994).

Segundo (Góis (1993) apud CAMPOS (org.), 1996, p. 11) a psicologia comunitária pode ser definida como “uma área da psicologia social que estuda a atividade do psiquismo decorrente do modo de vida do lugar/comunidade; estuda o sistema de relações e representações, identidade, níveis de consciência, identificação e pertinência dos indivíduos ao lugar/comunidade e aos grupos comunitários.

Visa ao desenvolvimento da consciência dos moradores como sujeitos históricos e comunitários, através de um esforço interdisciplinar que perpassa o desenvolvimento dos grupos e da comunidade. (...) Seu problema central é a transformação do individuo em sujeito”.


Tipicamente, os trabalhos comunitários partem de um levantamento das necessidades e carências vividas pelo grupo-cliente, sobretudo no que se refere às condições de saúde, educação e saneamento básico. Utilizando-se de métodos e processos de conscientização, procura-se trabalhar com os grupos populares para que eles assumam progressivamente seu papel de sujeitos de sua própria história, conscientes dos determinantes sócio-políticos de sua situação e ativos na busca de soluções para os problemas enfrentados.

Pode-se destacar em termos teóricos que a aplicação do conhecimento parte do pressuposto de que ele se produz na interação entre o profissional e os sujeitos da investigação. Em termos de metodologia pode ser utilizado, sobretudo a metodologia da pesquisa participante, na qual o pesquisador e os sujeitos da pesquisa trabalham juntos na busca de explicações para os problemas colocados, e no planejamento e execução de programas de transformação da realidade vivida.

Quando se fala de valores, os trabalhos de psicologia comunitária enfatizam sobretudo a ética da solidariedade, os direitos humanos fundamentais e a busca da melhoria da qualidade de vida da população focalizada. Em termos éticos, busca-se trabalhar no sentido de estabelecer as condições apropriadas para o exercício pleno da cidadania, da democracia e da igualdade entre pares. Em termos políticos, questionam-se todas as formas de opressão e de dominação, e busca-se o desenvolvimento de práticas de autogestão cooperativa.



Políticas Públicas

As políticas públicas compõem um campo multidisciplinar, onde alguns estudos buscam explicar a natureza da política analisada e seus processos. Segundo (Lowi apud HOCHMAN (org.), 2007, p. 68) política pública é “uma regra formulada por alguma autoridade governamental que expressa uma intenção de influenciar, alterar, regular, o comportamento individual ou coletivo através do uso de sanções positivas ou negativas.”
Vários autores defendem seus pontos de vista sobre o conceito de políticas públicas, (Easton (1965) apud HOCHMAN (org.), 2007, p.68) contribuiu para a área ao definir a política pública como um sistema, ou seja, como uma relação entre formulação, resultados e o ambiente. Segundo ele, políticas públicas recebem inputs dos partidos, da mídia e dos grupos de interesse, que influenciam seus resultados e efeitos.

Política pública é o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, colocar o governo em ação, e analisar essa ação (variável independente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações (variável dependente).

A formulação de políticas públicas constitui-se no estágio em que governos democráticos traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e ações que produzirão resultados ou mudanças no mundo real. Depois de desenhadas e formuladas, se desdobram em planos, programas, projetos, bases de dados ou sistema de informação e grupos de pesquisa. Quando postas em ação, ficam submetidas a sistemas de acompanhamento e avaliação.


Programa de Reintegração do Egresso do Sistema Prisional - PrEsp

Um exemplo dessa ação entre governo e organizações que ocorre através das políticas públicas é o Programa de Reintegração do Egresso do Sistema Prisional/Penal – PrEsp, um dos quatro programas que fazem parte do Núcleo de Prevenção à Criminalidade – NPC, que pertence à Superintendência de Prevenção à Criminalidade (Spec) da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), onde o Governo de Minas Gerais realiza esse trabalho que busca contribuir com a redução das vulnerabilidades pessoais operando sobre fatores de risco, através de ações e projetos que promovam acesso aos direitos sociais como meios de recompor as condições de cidadão com autonomia como, também, promove a compreensão de temáticas de direitos humanos como modo de trabalhar o aumento do capital social, a sujeitos egressos do sistema prisional/penal e seus familiares.

Foi destacado como recorte de nossa realidade social, o campo prisional, seus sentenciados, por apresentarem um quadro comum: o forte índice de rejeição no imaginário social, grandes vulnerabilidades pessoais e reduzindo capital social. Percebendo as precárias e desumanas condições de retorno a sociedade dos sentenciados e entendendo esse estado de situação de vida como fator de risco a reentrada prisional, o Estado de Minas Gerais faz cumprir o Art. 25 na Lei de Execução Penal através do PrEsp que passa a assumir a incumbência de garantir ao sujeito do sistema prisional/penal acesso a seus Direitos em Lei de Execução Penal, através de assistência na orientação e apoio para a reintegração à vida em liberdade; na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de dois meses, onde permite ao profissional que atua na área social colaborar com o egresso para a obtenção de trabalho.

O PrEsp opera simultaneamente em três dimensões: levar ao imaginário social a importância do acolhimento real do sujeito do sistema prisional/penal como estratégia de redução da violência e prevenção à criminalidade; possibilitar acesso aos direitos sociais e trabalhar para a compreensão e implicação o aumento do capital social do grupo de usuários do programa.
No primeiro caso, o programa é usado como modo de produzir soluções para questões de ajuda e apoio a indivíduos, grupos ou instituições na sua particularidade; no segundo caso, o programa é um dispositivo de intervenção social, se liga ao problema como política pública. Trabalha para qualificar as condições de cidadania, buscando problematizar a realidade do acesso a direitos universais. A terceira dimensão desse aspecto se revela no trabalho de possibilitar a formação e o desenvolvimento do capital social através de atividades de grupos pautados em temáticas de direitos humanos, onde a confiança, a solidariedade, o coleguismo, a compreensão da violência e violações como forma de cuidados e formação cidadã são trabalhados.

Assim podem ser aplicadas a macro e micro políticas na aplicação desse trabalho, sendo equipamento da política pública de promoção de cidadania (macro política) e inclusão social de sujeitos egressos do sistema prisional/penal e seus familiares (micro política).
Macro política: são os movimentos de extensão do diálogo e de ações junto aos diferentes segmentos da sociedade, no sentido de co-responsabilização em relação a qualificar as reais condições de inclusão social do sujeito do sistema prisional/penal.
Micro política: toda ação territorializada que possibilite acesso aos direitos sociais do individuo egressos e familiares e a promoção de ações que elevem o capital social, através de diferentes formas de atividades em grupos, tendo como temas a confiabilidade, o espírito coletivo, solidariedade, participação, o coleguismo, a responsabilidade, o cuidado e a preocupação com o outro, com a comunidade e assim com a sociedade.

Nessa perspectiva, cabe-nos possibilitar condições para que os egressos possam vir a compor alternativas de sobrevivência real, com abertura para a criação de outros sentidos para o viver pessoal, coletivo, comunitário e social. A conferência “Políticas de Prevenção e Segurança Pública”, promovida pela Secretaria de Estado de Defesa Social e pelo Instituto Elo, trouxe a Belo Horizonte no inicio de junho 2009, Luiz Eduardo Soares, atual secretário Municipal de Assistência Social e Prevenção da Violência de Nova Iguaçu (RJ).

O público, formado por mais de trezentos convidados, contou com a participação de profissionais dos Núcleos de Prevenção à Criminalidade (NPCs) de Minas Gerais, representantes dos sistemas prisional e socioeducativo, policiais civis e militares, bombeiros, juízes, promotores e defensores públicos.
Para ele, a segurança é um direito elementar: “é condição de vida, liberdade e cidadania. Não pode adiar-se como promessa futura” (INSTITUTOELO). No entanto, a prevenção deve ser levada a sério nas comunidades vulneráveis, fazendo dos jovens o alvo prioritário dessa política. Luiz Eduardo Soares fala que Minas Gerais, nesse quesito, desenvolve uma “rica, fecunda, criativa e rigorosa experiência na área” (INSTITUTOELO).


Atuação do Psicólogo

Falar da atuação do psicólogo hoje em relação à psicologia comunitária é com certeza muito diferente do que comparar a décadas atrás. No início da atuação do psicólogo nessa área, a construção feita pelas pessoas sobre o papel desse profissional era baseada basicamente nas seguintes situações: algumas imaginariam o psicólogo em algum lugar mais pobre e sem infra-estrutura; outras veriam o psicólogo indo de encontro à população, população essa que geralmente desconhece esse trabalho assim como as suas possibilidades de ajuda; outras ainda pensariam em lugares como favelas, cortiços, bairros de periferia, lixões, assentamentos, mutirões, associações de bairros, grupos de mulheres, de jovens, de terceira idade, menores de rua, ou grupos marginalizados, dentre outros.

Poderíamos, então, indagar se todos estes exemplos caracterizam práticas da psicologia em comunidade. Para responder a isto se faz necessário recuperar o processo de surgimento desse tipo de prática, e para isto é necessário atender a dois aspectos: um ligado ao processo histórico pertinente a essa prática, recuperando as condições que contribuíram para o aparecimento dos chamados trabalhos em comunidade; e outro, ligado aos aspectos que podem explicar como a profissão de psicólogo foi sendo construída, criada, e em torno de que temáticas ou problemáticas essa prática profissional foi se estruturando e preparando novos quadros de psicólogos para a realidade brasileira.

Atualmente, procedendo a uma análise cuidadosa sobre as práticas da psicologia em comunidade, verifica-se a coexistência de vários trabalhos. Pode ser destacados que os trabalhos desenvolvidos em comunidade perderam seu caráter de clandestinidade, presentes nas décadas de 60 e 70. Com isso, diminuíram as dificuldades quanto à aceitabilidade ou permissividade do trabalho; e de outro, aumentaram as condições para se efetuar reflexões e análises sobre os aspectos intrínsecos a essa prática.
Houve um aumento significativo dos apelos, por parte do Estado, para uma maior participação junto à sociedade e às suas problemáticas. Institucionalizou-se o espaço para a atuação do psicólogo junto aos diversos setores e segmentos da população. O psicólogo pode atuar através de trabalho com equipes multidisciplinares que estabelecem procedimentos práticos de acordo com a demanda social e possibilidades de ação; em reuniões com os moradores para análise das necessidades e possíveis soluções, inclusive com o incentivo à formação de grupos de autogestão e à formação de recursos humanos da própria comunidade, e propostas de atividades específicas. Pode ser trabalhada também a importância de fortalecer o envolvimento afetivo com os objetivos e programas de ação na comunidade.

A promoção deste envolvimento tem sido feita exatamente através da busca de uma definição pela própria comunidade das prioridades de atuação. Neste sentido, o psicólogo atua mais como um analista-facilitador, que como um profissional que toma as iniciativas de solucionar os problemas, possibilitando assim que o sujeito social seja visto como produtor da cultura e das metodologias de desenvolvimento da consciência, proporcionando assim a tentativa de construção de um novo paradigma para a compreensão dos fenômenos psicossociais que se materializam e adquirem sua significação, em uma perspectiva micro e macroestrutural.

O Núcleo de Prevenção à Criminalidade – NPC dispõe de uma equipe multidisciplinar formada por psicólogos, assistentes sociais, e advogados. Essa equipe atua em todos os seguimentos necessários para tornar possível o processo de inclusão social e reintegração do egresso do sistema prisional.
Assim os profissionais atuam diretamente com o usuário do programa, com a família, com as parcerias firmadas onde são oferecidos cursos profissionalizantes e todo o trabalho de acolhimento, atendimento e assistência psicológica e de capital social como ocorre através da distribuição de cestas básicas, assim como tirar os documentos pessoais.

No NPC também são realizadas as oficinas temáticas que são palestras realizadas pelos profissionais do programa onde tem o título “Somos atores de nossa história”, na qual cada oficina trabalha mensalmente temas diversos como: Cidadania, violência doméstica, direitos humanos, afetividade, questão de gênero, dentre outros temas.
Através desse processo de intervenção o usuário e a família iniciam um processo de criação de perspectiva de vida e de melhoria na condição de trabalho e qualificação, além de proporcionar ao Egresso autonomia e sentimento de sentir-se como sujeito criador de sua própria história. Na conferência “Políticas de Prevenção e Segurança Pública”, o profissional do Núcleo de Prevenção à Criminalidade pôde acompanhar o andamento dos acontecimentos no que se refere às políticas públicas e se capacitar para assim desenvolver um olhar diferenciado no que diz respeito aos Egressos e como o profissional da psicologia poderá atuar no acompanhamento ao usuário e sua família.

Levando em consideração todos os elementos que compõem o quadro de vida e a realidade desses Egressos. Para se contribuir com uma vida psicológica mais saudável, é necessário que o trabalho a ser desenvolvido ultrapasse a esfera do individual e do particular, ao mesmo tempo, em que adquira uma perspectiva de apreensão da realidade – em sua totalidade e em real e concreta das pessoas.
Fazer isso, na especificidade do trabalho das práticas psicológicas, significa atuar dentro de uma perspectiva da psicologia social, em uma visão sócio-histórica, junto às relações que são travadas na esfera do cotidiano, eliminando-se posturas reducionistas, psicologizantes e a-históricas sobre os processos psicossociais.



REFERÊNCIAS

CAMPOS, Regina Helena de Freitas (org.). Psicologia social comunitária: da solidariedade à autonomia. 6.ed. Petrópolis,RJ: Vozes, 1996. p. 09-80.

Especialista em Segurança Pública é destaque em capacitação. Disponível em: Acesso em: 11 jun. 2009.

Programa reintegração social de egressos do sistema prisional. Disponível em: Acesso em: 11 jun. 2009.

SILVA, Lidiston Pereira. PrEsp – Programa de reintegração do Egresso do sistema prisional/penal. Belo Horizonte, 2008, p.01-26.

SOUZA, Celina. Estado da arte da pesquisa em políticas públicas. In: HOCHMAN, Gilberto (org.). Políticas públicas no Brasil. 20.ed. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007. cap. 2, p.65-74.

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